Banho cura
- Luciano Lopes
- 11 de abr. de 2020
- 2 min de leitura

Eram quase 21h da noite quando entrei em casa. O dia foi estressante e eu estava muito cansado. Deixei a mochila em cima do sofá e fui direto para o quarto. Tirei a roupa, entrei no banheiro e fiquei parado frente ao espelho. Por alguns segundos, olhei meu rosto e percebi o quanto estava sem energia. Os olhos estavam sem brilho, a cabeça doía e o semblante era, no mínimo, de dar pena.
Peguei o celular e abri um aplicativo de música, procurando por um instrumental de relaxamento. "Mantra for Guru", "Música para meditação", "Mantra Om" - foram alguns dos resultados da busca. Achei que esse último poderia complementar a cura da tensão com um banho revigorante. Minha mãe sempre dizia que banho curava tensão, mas eu nunca dei muita bola pra isso.
"Oooooommmmmmmmmm", repetia o mantra. Coloquei o volume no máximo e fui para debaixo do chuveiro. Abri o registro de inox e deixei a água cair sobre minha cabeça. Encostei o corpo na parede branca azulejada e, enquanto começava a me ensaboar, veio um choro compulsivo.
Entre a água do chuveiro e as lágrimas que saíam dos meus olhos, não havia distinção. Minhas duas estações - corpo e espírito - pareciam até estar sem sintonia. Consumido por uma tristeza nada bondosa, custei encontrar o mapa com o caminho do equilíbrio naquele momento. Pelo menos, era o que eu achava.
Enquanto o mantra do celular entoava mais um "Ommmmmmmmmmm" e a água do chuveiro escorria pela minha nuca, um dos pés escorregou e, na tentativa louca de me manter em pé, foi o chão que me acolheu mesmo. A cena era cômica: eu parecia um sambista em plena Sapucaí dançando no chão ensaboado, enquanto tentava me segurar (em vão) no registro do chuveiro. Sentado por obrigação da queda, foi aí que perdi o controle: tive uma crise de riso daquelas, que você não consegue parar. De gargalhar até tossir.
Levantei e, ainda rindo, acabei o banho. De toalha em frente ao espelho, meus olhos estavam vermelhos: agora, de chorar de rir! Desliguei o mantra, penteei o cabelo e vesti o roupão. Fui para a cozinha preparar uma salada com castanhas, tomate seco e queijo. O momento agora pedia outro tipo de música: em vez do mantra, fui de samba: "Liberdade, liberdade, abre as asas sobre nós. E que a voz da igualdade seja sempre a nossa voz..." - entoava Simone em sua versão para "O Amanhã", samba-enredo de sucesso da União da Ilha do Governador.
"O que será o amanhã, como vai ser o meu destino?", eu cantava pela cozinha, feliz de ter encontrado o caminho (dolorido mas divertido) do equilíbrio. Entre alfaces e tomates, tirei o estresse para fora do mapa. E pensar que minha mãe sempre esteve certa: banho cura tensão. Ah, se cura!
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