Manoel de Barros, o pássaro das palavras
- Luciano Lopes
- 26 de abr. de 2020
- 2 min de leitura

Ele era escritor e passarinho. Voava pelas matas, jardins e rios do mundo lançando sua poesia natural e marcante. Cativava o mais duro dos corações com o baque de um verso. Para o poeta com barro no nome, nada e tudo eram planejados. Sílabas sentidas mais que pensadas. Tinha maestria em declamar a natureza pela íris do coração. E a instabilidade semântica sempre foi sua melhor flor.
Não tive a oportunidade de encontrar com o ser de luz que foi Manoel de Barros, poeta cuiabense que publicou seu primeiro livro – “Poemas Concebidos sem Pecado” – em 1937, aos 21 anos. Mas me conforto com as coincidências: somos ligados pelo dia de nascimento, 19 de dezembro, pelo signo, pela devoção à natureza e pelas palavras. Estas, a minha melhor fraqueza.

Formado em Direito na capital carioca, chegou a morar no exterior por ter se desiludido com com a política. Recluso e tímido, o reconhecimento como escritor e poeta só veio nos anos 1980, quando três outros grandes pássaros de nossas florestas literárias - Drummond, Millôr Fernandes e Antônio Huaiss - deram notícia do seu belíssimo bater de asas.
Como se materializava a poesia do mestre, que viveu as últimas décadas no meio do Pantanal? Ele mesmo diz: “A água passa por uma frase e por mim. Macerações de sílabas, inflexões, elipses, refegos. A boca desarruma os vocábulos na hora de falar e os deixa lanhos na beira da voz”.
Na década terceira de seu voo pela Terra, jogou sementes e fez nascer três árvores: os filhos João, Pedro e Martha, todos vindos da união em flores com a amada Stella, quem sempre presenteava com um cheiroso jasmim. Depois do falecimento do poeta, em novembro de 2014, só Martha e a mãe continuavam em fotossíntese. As copas das árvores de João e Pedro já haviam alcançado o céu e o sol divinos bem antes do Manoel pássaro e semeador.
Barros nos deixou órfãos de sua presença, mas envolvidos no aconchego de sua poesia eterna.
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